Tudo é apresentado de forma tão maravilhosamente improvável que, no fim das contas, acreditamos que nos tornamos melhores neste breve período do ano. Então, virtualizamos o mundo concreto: mundo provido de intolerância, medo, violência nas ruas, no trânsito, nas esquinas da vida, sob sol que queima a cuca legal de pessoas do mundo todo e do Brasil, vixe! Nem se fala...
Será que as pessoas que pedem nas ruas, que dormem nas ruas acreditam nesse mundo maravilhoso apresentado no natal? Será que as crianças que passam fome e que "não têm mais direito a nada" acreditam em papai Noel? Será que o bom velhinho passa lá? Será que os excluídos de dígnos salários, de saúde pública respeitável e de uma educação gratuíta que possam levá-los a uma real libertação acham que o natal é tão fantástico assim? Ou será que o natal é somente uma imaginação bem imaginada apontando direto pelos burgueses e para os pseudo-burgueses ou pseudo-pseudo-burgueses (como eu)?
Todo mundo se traveste de bonzinho, mas esquece que a bondade deveria ser um padrão constante em todas as pessoas (no mínimo deveria ser perseguida o tempo todo). E essa bondade não necessariamente precisaria ser aquela quase angelical do natal, mas sim, uma bondade holística que fosse crítica o suficiente para respeitar as diferenças, as minorias, o planeta e sua preservação mínima, que pudesse aceitar o limite alheio e o próprio afim de que fosse possível uma vida mais branda e leve - sem tantas mortes estúpidas e imbecis como vemos todos os dias e sem tanta usurpação vampiresca dos que estão lá em cima para com os que estão lá embaixo da cadeia alimentar humana. Afinal, "o de cima sobe e o de baixo desce", e não precisava ser mais assim.
Mas, no natal esquecemos nossos males e desigualdades. Vamos sendo levados pelo ideal consumista das mídias que ganham muito dinheiro com essa coisa toda (salve os inventores da fábrica de alienações de consumo que tão bem o capitalismo se apropriou). Por que não buscamos o bem e o bem dos outros de forma honesta e verdadeira o ano inteiro (um eterno natal de sentimentos)? - começando na política, nas famílias, na espiritualidade sem segundas intenções, no trânsito, nas fábricas, nas escolas, nas ruas, campos e construções. Já que o tempo não pára, desejo bons ventos a todos, todos os dias e em todos os anos, e não somente no natal. Seria muito bom se consumíssemos doses cavalares de compreensão, de paz interior, de paciência com o outro, de respeito ao que nos faz vivos, de honestidade e do mais alto, duradouro e verdadeiro amor pelo próximo e pelo universo que nos abriga tão gentilmente.